quarta-feira, 4 de junho de 2014

[Educação & Carreira]: Qual o papel do Psicólogo Educacional?


É com regozijo que inauguro a rubrica “Educação & Carreira”, em colaboração com o Psicologia Para Psicólogos.
Para estrear este espaço de escrita e leitura, e principalmente de reflexão conjunta, pareceu-me pertinente começar com uma explicação – ou talvez mesmo desmistificação – do que é o papel do psicólogo educacional.

Tendencialmente associa-se o psicólogo educacional ao contexto escolar. Pois então pergunto aos leitores o que é para vós educação? Quantos de nós não ouvimos já aquela expressão que diz que “os pais educam e os professores ensinam”? Não que eu esteja de acordo com isso! E se nunca ouviram, até me alegro! Mas, sendo isso verdade, qual seria a pertinência de um psicólogo educacional, num espaço meramente de ensino?! Pois bem, a escola não é apenas um espaço de ensino-aprendizagem, do mesmo modo que não é preciso um espaço físico institucionalizado para que haja aprendizagem. A aprendizagem acontece naturalmente.
Quanto à educação, considerando as origens etimológicas da palavra “educar” (do latim educare e educere), refere-se a “conduzir para fora”, ou seja, orientar o potencial individual para o exterior. Como tal, acontecem fenómenos educativos nos diversos contextos da vida, em qualquer papel que a pessoa desempenhe (cidadão, filho, trabalhador, estudante, etc.). Trata-se de um processo de desenvolvimento e crescimento contínuo. Logo, não é um fenómeno estanque nem pontual. É um processo de transformação longitudinal e transversal, que visa o alcance de determinado objetivo. Qualquer pessoa em qualquer idade vive processos educativos. Reforço: em qualquer contexto em que se insira.
Assim, o psicólogo educacional não é apenas um psicólogo que trabalha com crianças / jovens em contexto escolar. É sim um psicólogo cuja prática se orienta para o desenvolvimento humano. Com as suas valências psicológicas e pedagógicas, actua para a promoção e desenvolvimento do potencial do(s) seu(s) cliente(s). Maximizar as capacidades, assegurando a qualidade de vida e desempenho da pessoa, seja individual ou grupalmente, em aspetos pessoais, sociais, escolares ou profissionais.

Possíveis contextos de intervenção do psicólogo educacional:
• Centros de formação
• Escolas
• Universidades
• Instituições e empresas
• Juntas de Freguesias / Câmaras Municipais
• Projetos comunitários
• Centros de estudo
• Centros de emprego / GIP’s (Gabinetes de Inserção Profissional)
• Lares de idosos
• Clínicas
• Etc.

Valências da sua intervenção:
• Promoção de competências
- Socioemocionais
- Escolares
• Avaliação psicológica
• Formação
• Consultoria
• Promoção do autoconhecimento
• Orientação & Gestão de carreira
- Aconselhamento vocacional
- Desenvolvimento de projetos
• Promoção de saúde e bem-estar
• Apoio comunitário e familiar
• Conceção, aplicação e avaliação de programas de natureza educativa e/ou formativa
• Coordenação de equipas cuja atuação tenha finalidades psicológicas e/ou educativas
• Etc.

Renata Leone Tocalino

Não se pode ensinar tudo a alguém. Pode-se apenas ajudá-lo a encontrar por si mesmo.” (Galileu Galilei)

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Evento: "Adaptação - Uma Viagem por Novos Caminhos"


Adaptação - Uma Viagem por Novos Caminhos




Nova Autora: Renata Leone Tocalino


Damos as boas-vindas à nossa nova autora, a Renata Leone Tocalino.

A Renata será a responsável pela rubrica “Educação & Carreira”.

Mestre em Psicologia da Educação e da Orientação, pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, é Investigadora na área da construção de carreira. Realizou o seu estágio curricular no Agrupamento de Escolas Fernando Pessoa.

Psicologia Para Psicólogos

terça-feira, 27 de maio de 2014

[Comboio do Desenvolvimento]: Noção de Estádio de Desenvolvimento Parte II


Vimos, há uns dias atrás, como a divisão do ciclo de vida humano utilizada por diferentes culturas, em diferentes momentos históricos, já parece confirmar, e também desafiar, as noções de fase, etapa, nível, estádio do desenvolvimento psicológico.
A partir do seculo XIX, a teoria da evolução induziu uma ampla utilização destas noções por diversas disciplinas científicas. Para além dos estádios de evolução das espécies propostos pela própria biologia, os geólogos, por exemplo, descrevem-nos as várias eras de formação do globo terrestre ou os sociólogos os diferentes estádios de evolução das sociedades. 
Nas palavras de Tran-Thong (1976), a noção de estádio ou etapa descreve então e essencialmente “os momentos sucessivos de um devir” (p.371), uma vez que “traduz, numa ordem irreversível, o tempo que dura uma qualidade ou um estado, entre o seu aparecimento e o seu desaparecimento ou a sua substituição ou integração num outro estado ou em uma outra qualidade” (p.371).
Para além da história, da educação e das múltiplas disciplinas científicas que as utilizam, as noções de fase, etapa, nível, estádio de evolução de um qualquer fenómeno físico ou social encontram ainda o seu fundamento teórico no debate filosófico sobre o devir que, em Heráclito, Lau-tseu, Hegel, Bergson e muitos outros, é universal e contém em si-mesmo a contradição entre o permanente e o mutável, o uno e o múltiplo, o contínuo e o descontínuo.    
Porém, se olharmos a história da nossa disciplina, a delimitação de fases, etapas ou estádios do desenvolvimento psicológico começou por se centrar mais na descrição das mudanças ou descontinuidades que marcam a evolução e diferenciação progressiva da conduta da criança e do adolescente. Vejamos!
As primeiras descrições do desenvolvimento psicológico são diários ou relatos biográficos do aparecimento sucessivo dos novos comportamentos ou capacidades que podem ser observados ao longo dos primeiros anos de vida.
Já em 1787, Dietrich Tiedmann, Professor de Grego e Filosofia na Universidade de Marbourg, propõe as “Observações sobre as Capacidades Mentais nas crianças”, onde relata detalhadamente a mudança e evolução do comportamento sensório-motor e da linguagem do seu filho até aos 2,5 anos de idade.
Multiplicam-se então as biografias de bebés e crianças pré-escolares e, passado um século, o próprio Charles Darwin regista, com a colaboração da mulher, o desenvolvimento dos seus 10 filhos, particularmente do mais velho, William Erasmus, entre 1839-1844, e de Anne Elizabeth, nascida em 1841. A partir das suas próprias observações, Darwin constrói então um questionário sobre a expressão de emoções e obtém dados adicionais de familiares com filhos pequenos e de outros cientistas que observavam animais, crianças ou indivíduos de diferentes etnias, com perturbações psíquicas ou défices sensoriais. Esta extensa investigação culmina na publicação “The Expression of the emotions in man and animals”, em 1872, e ainda de um artigo, “A biographical sketch of an infant”, publicado em 1877, que nos oferece um relato, naturalista e rigoroso, da ontogénese da conduta sensório-motora, da imitação e linguagem, das expressões emocionais de raiva, medo ou prazer de brincar, do pensamento, consciência de si e sentido moral que observara ao longo dos primeiros 5 anos de vida do seu filho mais velho.
Celeri, Jacintho e Dalgalarrondo (2010) traduziram este artigo para português. Deixo aos meus leitores dois pedaços desse texto que atestam bem o rigor de observação e o interesse de Darwin pela evolução das mudanças de conduta do pequeno William Erasmus.
Contudo, é Wilhelm Preyer, contemporâneo de Darwin, que nos deixa “The Mind of the Child” (1882), a obra eventualmente mais marcante desta fase pioneira da Psicologia do Desenvolvimento, que aqui evocaremos dentro de alguns dias.
 
Conduta sensório-motora
“Durante os primeiros sete dias de vida várias ações reflexas, por exemplo, espirrar, soluçar, bocejar, esticar-se e, obviamente, sugar e chorar são bem executadas pelos bebês. No sétimo dia eu toquei a sola nua de seu pé com um pedacinho de papel e ele retirou-o para longe, encurvando ao mesmo tempo seus dedos, como uma criança mais velha faz quando lhe fazemos cócegas.”
 
Emoção, Comunicação e Linguagem Verbal
“…os desejos de um bebé são inicialmente tornados inteligíveis pelos gritos instintivos que, depois de um tempo, são modificados em parte inconscientemente e em parte, como acredito, voluntariamente, como uma maneira de comunicação - pelas expressões inconscientes peculiares, pelos gestos e de forma marcante por diferentes entonações - e, finalmente, pelas palavras naturalmente inventadas pela criança. Depois as palavras são imitadas de forma mais precisa, a partir da audição e esta capacidade é adquirida de uma forma maravilhosamente rápida.”
Maria Stella Aguiar
Referências
Cairns, R.(1983). The emergence of developmental psychology. In P.H. Mussen (Ed.) Handbook of Child Psychology, Vol. 1 (4th edition) (pp.41-95). NJ: Wiley.
Cairns, R., & Cairns, B. (2006). The making of developmental psychology. In W. Damon & R. M. Lerner (Eds.) Handbook of Child Psychology, Vol. 1 (6th edition) (pp. 89-165). NJ: Wiley.
Celeri, E., Jacintho, A., & Dalgalarrondo, P. (2010). Charles Darwin: um observador do desenvolvimento humano. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 13, 4, pp. 558-576. (http://dx.doi.org/10.1590/S1415-47142010000400002) 
 

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Evento: "Seminário Científico sobre Modelos Sistémicos de Intervenção"


O Psicologia Para Psicólogos renovou a parceria com a Turma de 5ºAno de Sistémica da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa!
Assim, estamos mais uma vez presentes no seu evento cientifico anual.


“É com muito gosto que vos convidamos a embarcar na viagem «Explorando os mundos da Sistémica». A viagem tem data marcada para o dia 30 de Maio às 9 horas no anfiteatro Professor Ferreira Marques na Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa.
Neste encontro contamos com a presença dos alunos de 5º ano de Psicologia Sistémica, que vos falarão sobre as suas experiências nos locais de estágio curricular que visitaram. Para além disso, teremos os testemunhos de convidados especiais, e muitas surpresas.
Gostaríamos de partilhar convosco este momento celebrativo de final de um ciclo da nossa vida.
Ficamos à vossa espera,
Turma de Clínica Sistémica".

Psicologia Para Psicólogos

sábado, 17 de maio de 2014

[Auto-cuidado]: Se a sua ansiedade falasse...


Se a sua ansiedade falasse, o que lhe diria?

Esta pergunta pode parecer estranha à primeira vista, o que é certo é que as perturbações depressivas e ansiosas afectam cada vez mais pessoas em Portugal e um pouco por todo o mundo. A ansiedade pode manifestar-se de várias formas: com o ritmo cardíaco acelerado, uma sensação constante de inquietação, suores frios e/ou localizados (ex: mãos), voz trémula, dores no corpo, entre outras.
Outro dos aspectos que pode vir associado à ansiedade é que ela parece ser pouco concreta e muitas vezes não é claro para uma pessoa ansiosa o que lhe faz surgir a ansiedade. Quando isto acontece, o sofrimento aumenta, pois aparentemente, nada parece estar associado a uma condição que acompanha a pessoa durante grande parte dos seus dias.
Vou sugerir-lhe um exercício: imagine a sua ansiedade como algo real, palpável, se fosse uma figura, como seria? Seria grande ou pequena? Provavelmente seria algo grande, devido ao domínio que tem sobre a sua vida… Que cor teria, e quais seriam as suas feições? Imaginando essa ansiedade a falar consigo, que tipo de tom de voz teria, grave e assustador ou agudo e arrepiante? Imagine-a à sua frente e pense nas coisas que ela lhe diria. A verdade é que a nossa ansiedade fala connosco, mas muitas vezes não a ouvimos, porque estamos concentrados nos sintomas físicos que ela nos provoca e tomamos medicamentos para os acalmar. Que preocupações é que a sua ansiedade o/a está sempre a lembrar? Pergunte à sua ansiedade porque é que ela está presente tantas vezes no seu dia-a-dia? O que se imagina a responder-lhe quando ela lhe lembra constantemente sobre temas que tem pendentes ou sobre receios do que possa acontecer no futuro?
Para muitas pessoas é bastante apaziguador saber que podem ter conversas com a sua ansiedade. A ansiedade tem como função deixar-nos alerta para os perigos que possam acontecer, é uma condição bastante centrada no futuro e muitas vezes naquilo que pode correr menos bem. Ela é importante porque faz com que o nosso corpo liberte substâncias como a adrenalina e que nos mova em direcção aos nossos objectivos. Quando se torna excessiva é bloqueadora e paralisadora, funcionando contra nós.
Repare naquilo que activa a sua ansiedade, pode até anotar os momentos em que se começa a sentir ansioso/a e aquilo que a sua ansiedade lhe está a dizer. Pode também responder-lhe e permitir-se deixar essas preocupações para mais tarde quando tiver mesmo de agir, em vez de estar ansioso/a por antecipação. Pode também ir dizendo à sua ansiedade que já fez tudo o que estava ao seu alcance para resolver a situação e que gostaria que ela não colocasse tanta pressão sobre si.
Estes exercícios ajudam a observar o que está a acontecer consigo e a dar-lhe algum controlo sobre uma ansiedade que parece ter vida própria.
Se a ansiedade se mantiver incontrolável e avassaladora, fará sentido procurar o apoio de um/a psicólogo/a para perceber e controlar a sua ansiedade.

Ana Sousa

segunda-feira, 12 de maio de 2014

[Criminal-Forense]: Jurados nos Tribunais?

Em Portugal existem jurados nos tribunais? E se existem, deveriam existir?  

     O tribunal de júri português é constituído por três juízes do tribunal coletivo, quatro jurados efetivos e quatro suplentes, que se pronunciam acerca da culpabilidade e sanção do arguido. Em 2011, verificaram-se 19 julgamentos com este tipo de tribunal em Portugal.
Pode ser requerido pelo Ministério Público, assistente (ofendido) ou arguido, em questões de matéria de facto (responsabilidade, intenção, dolo/negligência...), crimes contra a segurança do Estado (violação de segredo de Estado, espionagem..., com excepção do terrorismo) e crimes com pena abstrata superior a oito anos de prisão (homicídio, ofensa à integridade física grave, escravidão, tráfico de pessoas, violação, abuso sexual de crianças...).

Será que deveria existir?
Os argumentos a favor relacionam-se com a maior compreensão do papel do juiz e das dificuldades do sistema de justiça, a prevenção ao abuso de poder e a representação das crenças, valores e atitudes da comunidade na sala de audiência.
Na minha perspetiva, a presença dos jurados deveria ser apenas estipulada para certos ramos do direito, como o cível e o laboral, que possuem penas menos gravosas e lidam com questões de menor censurabilidade e interferência com a integridade física e bem-estar psicológico da pessoa.
O direito penal e de família e menores exigem uma maior competência e experiência em julgar, tendo o juiz recebido formação para este propósito. Estas decisões por parte dos jurados estão assim relacionadas com questões de credibilidade, probabilidade de acontecimentos e inferência de intenções. Paralelamente, pode verificar-se falta de entendimento acerca da linguagem utilizada pelos juízes e sobre o procedimento criminal.
No que concerne ao tipo de crime, um caso de homicídio despoleta maior pressão social e pessoal, pela sua carga afetiva, do que um caso de evasão fiscal. Um jurado poderá não ter capacidade para lidar com crimes como o abuso sexual de menores, traduzindo-se assim numa falta de competência para julgar imparcialmente.

Ana Isabel Lopes

Referências
                BDJUR (2013). Código Penal. Coimbra: Edições Almedina. Consultado no dia 4 de Março de 2014, através de http://bdjur.almedina.net/citem.php?field=item_id&value=1172736.
                Constituição da República Portuguesa, (1976). Consultada no dia 6 de Março de 2014, através de
                DR (1987). Decreto-Lei n.º387-A/87 de 29 de Dezembro. DR, 1ª Série, n.º 298 de 29 de Dezembro. Retirado de http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=315&tabela=leis
                Jólluskin, G. (2009). O tribunal do júri no ordenamento jurídico português: Uma abordagem na perspectiva da psicologia. Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (6), 116-126. Porto: Edições Universidade Fernando Pessoa.
                Nemeth, C. (1981). Jury trials: Psychology and law. Advances in Experimental Social Psychology, Vol. 14. Academic Press, Inc.
                Sacau, A. & Castro-Rodrigues, A. (2008). A cidadania e a (des)identificação dos cidadãos com a justiça – um contributo da  Psicologia. Trabalho apresentado no projecto “Análise psicológica da tomada de decisões judiciais”.
                Sacau, A. & Jólluskin, G. (sem data). El tribunal del jurado: Reflexiones sobre el ejercicio de la  ciudadania. Porto: Universidade Fernando Pessoa.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

[Envelhecer]: Solidão


Um tema que surge frequentemente associado aos Idosos é o isolamento.
A perda, na maior parte dos casos, da rede social associada à actividade laboral, com a reforma, e a saída dos filhos de casa marcam o início do que para muitos é o princípio do fim da vida. A rampa final onde simplesmente se padece e pacientemente se espera.
Um dos factores deste isolamente é a perda dos familiares e amigos da mesma idade que vão perecendo ao longo dos anos e, previsivelmente, com o avançar dos anos estas perdas tornam-se mais numerosas, criando maiores vazios na rede social destas pessoas.
Estes sobreviventes da sua geração além de lidarem com as suas perdas relacionais vão perdendo algumas das características que a sociedade moderna tanto valoriza, como a velocidade, a flexibilidade, a agilidade na adaptação, e a juventude, ficando ainda mais isolados da restante sociedade.
Apesar do tom deste discurso não pretendo ignorar que há excepções a esta regra, no entanto esta é a regra quando se fala e pensa acerca dos idosos, a visão pessimista do desenvolvimento prevalece. Por isso gostaria de deixar aos leitores uma reflexão acerca do isolamento, ou será da percepção do mesmo? E percepção de isolamento por parte de quem vive esta etapa da vida ou de quem a olha de fora? Estarão os idosos mais sozinhos do que os jovens? Será que existem diferenças entre os idosos que vivem na cidade, rodeados de casas vazias todo o dia e de pessoas que não sabem o seu nome e os que vivem nas aldeias onde sempre viveram mas longe das oportunidades de socialização urbanas? E ainda estarão os idosos religiosos mais sós do que os agnósticos?
Gostava de contar com as vossas ideias acerca da solidão envelhecida.

Ana Carla Nunes

domingo, 4 de maio de 2014

“Não sabendo que era impossível, foi lá e fez.”


“Não sabendo que era impossível, foi lá e fez.”

            Não, deixou de o ser. O que era continuou a sé-lo. Mas a avaliação “impossível” é que veio de alguém diferente. Pensamento diferente, percepção diferente, esquemas diferentes. Limitações subjectivas que a tendência Humana empurra e atribui aos outros. O que eu achar impossível para mim, assim o terá de ser para os outros.

            Mas outros, não sabendo da minha avaliação, criam a sua. E a sua é, obrigatoriamente, diferente das anteriores. Podem ter as mesmas palavras nas conclusões retiradas, mas os caminhos que a levaram até lá foram diferentes. E mantêm os comportamentos a ocorrer diferentes também. Isto ocorre pois a percepção dos estímulos envolventes às situações são entendidas por cada um com base nas suas experiências anteriores, e isso, como é entendido, é idiossincrático. Uma mesma situação é entendida por cada indivíduo de forma diferente. Variando entre indivíduos, varia ainda em cada momento do mesmo, pois face a situações semelhantes, temos respostas diferentes ao longo do tempo.
            Se a avaliação da situação não é de que a mesma é impossível, os esquemas criados para a mesma não a mostram como tal. Assim, as limitações do funcionamento esquemático são diferentes, mais abertas, menos rígidas, e permitem uma melhor adaptação face à mesma. A conclusão será, assim, a mais adaptativa possível no sentido do objectivo desejado de acordo com os comportamentos realizados.

            A atribuição de rótulos baseados em avaliações de terceiros levam-nos a erros de percepção para as situações do dia-a-dia. Algumas, como diz a história espelhada nos provérbios e fado cultural de um povo, ajudam-nos a viver melhor, evitando isto e aquilo, como um guia tradicional a realizar. Outros, inibem experiências e desenvolvimento pessoal, pensamento crítico e acção geradora de bem-estar.
            A distinção entre ambas é essencial para a melhor adaptação dos indivíduos que potencie o seu desenvolvimento enquanto seres Humanos, Pessoas, Cidadãos, e todos os outros papeis que, bem ou mal, temos na sociedade.

            Tiago A. G. Fonseca

segunda-feira, 28 de abril de 2014

[Competência(r)]: Competência(r)


A área das competências tem diversas questões-chave que os investigadores e teóricos ambicionam responder.
A competência humana tem vindo a ser definida como um conjunto de competências, entre as quais a competência social que consiste num conjunto de ações, atitudes e pensamentos que o indivíduo apresenta em relação à sociedade, à sua comunidade, aos indivíduos com que interage e a ele próprio. Assim, é fácil compreender que este se tenha constituído um campo de estudo da psicologia. Por exemplo, já Thorndike em 1920, sugeria três tipos de inteligência, um dos quais se reportaria à inteligência social ou competência social. Muitos outros autores têm estudado este constructo, utilizando vários nomes e diferentes definições, mas é unânime a importância deste campo para a psicologia.
Existe uma competência social, equiparando-se ao Fator g, ou existirão diversas competências sociais (como as inteligências múltiplas)? E ainda, a distinção, em termos práticos, entre treino de competências sociais, desenvolvimento pessoal e desenvolvimento de competências sociais e emocionais.
Diversos autores têm-se debruçado sobre as questões enumeradas, sendo que várias referências podem ser apontadas para a discussão teórica sobre estes temas.
Assim esta rubrica pretende reunir alguma bibliografia essencial sobre estes temas teóricos mas avançar também com aspetos mais práticos sobre o desenvolvimento de competências sociais e emocionais.

Marta Marchante

segunda-feira, 21 de abril de 2014

[PREVENIcaNDO]: Vai uma cartada?


O Baralhações é um material de dinamização de grupos que um dia tive a possibilidade de criar. É um baralho de emoções através do qual muitas reflexões podem acontecer a partir de uma abordagem lúdica. Porque nem todas as prevenções são universais e porque nem todas as dinâmicas são de grupo, escolhi uma experiência que tive com este material para o ilustrar.
Habituamo-nos a pensar a prevenção como algo que acontece antes dos problemas que queremos evitar mas frequentemente lidamos com situações em que procuramos prevenir que os problemas venham a ser maiores do que já são. Esta é a esfera da prevenção indicada e nela se movem profissionais e indivíduos que gerem situações de risco presente que se deseja que não passem a risco instalado. Era esta situação que eu tinha pela frente com um jovem que apresentava consumos esporádicos de cannabis. Falava-me da confusão dos seus sentimentos e da dificuldade de os gerir, da incapacidade de os ler corretamente quando expressos pelos outros e sobretudo do seu jeito desajeitado de dar resposta. Propus-lhe que batêssemos uma cartada.
Achou que eu estava maluco - o que em psicologia dá sempre jeito para que o outro não nos veja de forma tão ideal - mas aceitou quando me viu puxar do Baralhações. Explorou algumas das cartas e dos desenhos bem dispostos que o ilustram e perguntou-me como se jogava. Disse lhe "tem dias". A convicção do meu "amalucanço" aumentou. Expliquei que o jogo que íamos jogar mudava consoante o dia, mas que, hoje, era muito fácil. Cada um de nós teria cinco cartas ao acaso e que iríamos simplesmente bater umas cartas. Cada vez que puséssemos uma carta na mesa poderíamos ir ao baralho buscar outra. Estas eram as regras básicas, mas consoante as situações as regras poderiam mudar. Ele concordou e começamos a jogar.
 
A primeira carta foi minha e perguntei-lhe o que é que ele achava que a imagem representava. Era uma cena qualquer em que um grupo se divertia numa festa. Disse-me que parecia representar alegria. Perguntei lhe então o que é que eu quereria dizer jogando uma carta de alegria. Pensou um pouco. "Pode querer dizer que está alegre... Ou desafiar-me para ir a uma festa... Sei lá." Sugeri-lhe que batesse uma carta de resposta. Olhou para as suas cinco cartas e acabou por escolher uma outra em que três amigos parecem pousar para uma fotografia com um a fazer corninhos ao outro. Fui ao baralho e procurei nele a carta que me interessava e coloquei-a em cima da mesa. Quando foi a vez de ele biscar disse-lhe que não podia escolher. Teria de tirar uma carta qualquer ao acaso. Reagiu. "Isso não é justo". Expliquei-lhe que nem todos tínhamos acessos às cartas da mesma maneira e que se ele queria jogar teria de aceitar a regra. Rabujou mas acabou por lançar uma segunda carta. Repeti a procura da carta que mais me interessava e quando ele se apressava para biscar disse-lhe que, embora pudesse fazê-lo não poderia ver a carta. "Então para que é que serve?" "É um recurso que tens. Sabes que o tens mas não sabes qual é". Voltou a rabujar. Com menos cartas visíveis a tarefa dele tornou-se mais difícil. Não tinha cartas de jeito. E ainda por cima não podia ver a última. Disse-lhe que podia passar. Deu-me a vez e eu fui buscar nova carta e dei continuidade a este diálogo de emoções. Disse-lhe que como não tinha deitado uma carta fora não poderia biscar, mas eu permitia-lhe trocar uma carta que não lhe interessasse por outra do baralho, com a condição de ele não poder ver a que biscasse. Embora não gostasse da regra aceitou-a. Passou a ter duas cartas desconhecidas e três que pouco lhe interessavam. Concordamos que, ao não jogar, não só a situação dele não melhorava como eu poderia começar a desinteressar-me dele. Disse-lhe que respondesse de qualquer modo. Ou com uma carta completamente dissonante da minha ou arriscando uma carta das desconhecidas.
O jogo continuou com outras peripécias mas no fim o resultado foi uma grande irritação com o resultado daquele diálogo. A conversa sobre o jogo ajudou o jovem a rever-se na dinâmica. De facto nem sempre temos ao nosso dispor as cartas que queremos, às vezes porque o nosso baralho é pobre, outras vezes porque não sabemos jogar com as cartas que temos outras ainda porque não nos conhecermos suficientemente bem para sabermos das nossas cartas. Aí, claramente podemos optar por nos retrairmos e sair do jogo, ficar a ver sem participar ou arriscar, e mesmo podendo parecer estranho, o diálogo permitirá a troca e o crescimento. O sorriso de se ver ilustrado no jogo permitiu-me perceber que a mensagem tinha sido captada. Ficamos um pouco mais a explorar o jogo com outras regras malucas, umas minhas outras dele, mas a cartada seguiu animada. No final da sessão despediu-se a rir. "Ninguém vai acreditar que estive a tarde a jogar as cartas consigo." "Pois. É tão plausível como dizer que me diverti imenso com os teus problemas".
Enfim. Quem disse que a prevenção tem de ser muito séria? O importante é que faça sentido.

Raúl Melo

quinta-feira, 17 de abril de 2014

[Comboio do Desenvolvimento]: Noção de Estádio de Desenvolvimento


Fases, etapas, níveis, estádios…do desenvolvimento psicológico

Vimos que, desde há muito tempo, a descrição do ciclo de vida das pessoas induziu a delimitação de diferentes fases, períodos, etapas, níveis ou estádios do desenvolvimento físico e psicológico associadas a diferentes práticas educativas ou de socialização.
Contudo, deixei uma interrogação aos meus leitores sobre a natureza universal ou relativamente consensual dessas divisões do ciclo de vida, recordam-se? Mais precisamente, será que ao longo da história, nas diferentes culturas ou até entre os investigadores do desenvolvimento humano, nos deparamos sempre com uma divisão comum, idêntica, dessas fases, períodos, etapas, níveis ou estádios que parecem marcar a sucessão do desenvolvimento humano?
Por hoje, vamos então invocar alguns exemplos históricos e interculturais que desafiam a nossa reflexão. 

Conta-nos Tran-Thong (1976), que na Índia antiga, a vida das pessoas das castas socialmente mais elevadas era dividida em seis períodos associados a diferentes rituais e modos de viver. O recém-nascido era sujeito ao rito da denominação; aos 3 anos, a criança submetia-se ao corte do cabelo e recebia o traje da sua família; entre os 8 e os 12 anos, era confiada a um preceptor numa cerimónia que marcava o seu nascimento espiritual e o início do tempo de educação literária e marcial; aos 16 anos, o jovem voltava à casa paterna, era sujeito ao rito do corte da barba e declarado pronto para casar para, em seguida, passar a dono de casa, responsável pela sua família e pela sua profissão; por fim, quando se sentia velho, deixava a família, retirava-se na floresta, para meditar os textos sagrados e aceder ao estatuto supremo de monge, nómada e mendicante.  
Conta-nos ainda Tran-Thong (1976) que, entre os antigos romanos, a vida das pessoas era também dividida em seis fases que parecem, aliás, cada vez mais actuais nas nossas sociedades desenvolvidas: o infans até aos 7 anos, o puer dos 7 aos 17 anos, o adolescens dos 17 aos 30 anos, o juvenis dos 30 aos 46 anos, o senior dos 46 aos 60 anos e o senex dos 60 aos 80 anos.
Conta-nos finalmente Ferreira da Silva (1982) que na nossa cultura, ainda há pouco tempo, a vida das pessoas se dividia em quatro fases: a idade da razão aos 7 anos, a adolescência desde os 14 anos, a maioridade aos 21 anos e a aposentação aos 70 anos.

Ora, estes simples exemplos históricos e culturais sugerem já algumas conclusões que legitimam, mas também desafiam, a distinção e conceptualização de diferentes fases, etapas, períodos, níveis ou estádios no ciclo de vida humana.
Em primeiro lugar, há muito tempo que os homens se aperceberam que acontecem mudanças, orgânicas e psicológicas, relativamente uniformes, universais e irreversíveis, pois são comuns à maioria das pessoas, podem ocorrer em diversos contextos de vida e, quando ocorrerem, perduram no tempo e nunca mais se perdem.    
Em segundo lugar, há muito tempo que os homens se aperceberam que essas mudanças são direccionadas, progressivas e relativamente inevitáveis, pois obedecem a uma ordem de sucessão constante que acompanha, basicamente, a sequência de evolução e involução biológica do nosso próprio organismo e o percurso que, acreditamos, caracteriza o desenvolvimento psicológico típico do Homem.   
Em terceiro lugar, há muito tempo que os homens se aperceberam que essas mudanças não são meramente superficiais, contingentes, ocasionais ou idiossincráticas, são mudanças profundas, estruturais e consistentes da conduta humana que, como vimos, têm orientado e regulado a integração do indivíduo em diferentes níveis de educação e em diferentes formas de vida pessoal e social.

Porém, tanto o número de etapas, fases, períodos do ciclo de vida humana, como as idades e mesmo a identificação das mudanças que as demarcam, variam com o tempo histórico, com a cultura, com a classe social, enfim, com um conjunto de variáveis de natureza social, contextual e até individual que parecem também indicar que essas divisões permanecem eventualmente mais artificiais e culturais do que naturais, estruturais e consensuais.
Em síntese, um simples olhar histórico-cultural mostra já porque continua em aberto o debate sobre a noção de estádio do desenvolvimento psicológico. De facto, a conceptualização das mudanças que interessam os psicólogos do desenvolvimento permanecem ainda largamente dependentes da perspectiva de pensamento, moderno ou pós-moderno, dos próprios investigadores, dos seus domínios de estudo e das limitações metodológicas inerentes à própria investigação científica.

Maria Stella Aguiar

Referências
Chandler, M. (1997). Stumping for progress in a post-modern world. In E. Amsel & K. A. Renninger (Eds), Change and development. Issues of theory, method and application. N.J: Lawrence Erlbaum.
Lourenço, O. (2002). Psicologia de Desenvolvimento Cognitivo: Teoria; Dados e Implicações. 2ª Ed. Coimbra: Almedina.
Silva, F. (1982). Estudos de Psicologia. Coimbra: Livraria Almedina.
Tran-Thong (1987). Estádios e Conceito de Estádio de Desenvolvimento da Criança na Psicologia Contemporânea. Vol. 1 e 2. Porto: Afrontamento.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

[Temáticas Organizadas]: Gestão de Carreira: Para Além do Controlo


No mundo ocidentalizado, o ser humano vive grande parte da sua vida no futuro. Fazemos constantes previsões acerca da evolução da tecnologia, dos governos, dos mercados, do trabalho. Com base nesta visão de futuro, definimos estratégias que não fazem mais do que tentar assegurar que um determinado resultado é atingido. De forma semelhante, fazemos o mesmo com a nossa carreira quando definimos que curso completar e que profissão seguir; em que empresa trabalhar, que funções ocupar e quanto dinheiro ganhar. Mesmo que, muitas vezes, tal planeamento se aproxime mais de uma declaração de intenções, somos automaticamente impulsionados a definir uma visão de futuro para a nossa carreira. 
Na base desta abordagem à gestão de carreira está a crença de que, ao definir uma estratégia, conseguimos atingir um determinado resultado. É uma abordagem estritamente racional e parte do pressuposto que, com uma clara definição de objectivos e um ajustamento entre os interesses pessoais e as aptidões necessárias para o acesso à carreira, temos as condições necessárias para prever um caminho para o futuro. Planear a carreira desta forma, para além de nos motivar para a acção, transmite-nos uma percepção ilusória de controlo sobre o futuro. Mesmo que as leis do mercado tenham mudado e que prever o futuro seja cada vez mais difícil, a verdade é que continuamos a alimentar o artifício de que a carreira deve obedecer a uma sequência de etapas pré-definidas. 
Esta abordagem à gestão de carreira não é nem boa nem má por si só. Mas, nos tempos complexos e incertos que enfrentamos, qual a probabilidade de assegurar que seremos contabilista, médico, professor, consultor para toda a vida?
A verdade é que, enquanto vamos pensando na carreira em termos hipotéticos, o presente acontece. Vamos vivendo diferentes experiências de vida, acumulando diferentes papéis, valorizando diferentes abordagens e, quando de repente despertamos para o presente, damo-nos conta de que aquilo que planeamos deixou de fazer sentido. Por diversas circunstâncias, fruto de pressões externas ou internas, percebemos que o percurso de carreira que hipoteticamente definimos já não é viável e não consegue suprimir um conjunto de necessidades que queremos asseguradas. Outras vezes, percebemos que o que temos actualmente já não nos é suficiente. Quase sempre, quando o choque com o presente acontece, sentimo-nos fragilizados. De alguma forma, tornamo-nos vítimas inconscientes de um processo de desfasagem entre uma carreira idealizada e a realidade do mercado e da pessoa que somos hoje.
A carreira de uma pessoa é indissociável do cumulativo das suas experiências. Carreira e vida andam lado a lado uma da outra simplesmente porque não podemos dissociar o “eu” profissional do “eu” pessoal. As experiências que continuamente vivemos quer no trabalho quer na vida pessoal determinam quem somos e este é um facto com o qual temos de aprender a viver.
Pelas vivências que vamos acumulando, pelas oportunidades que não havíamos previsto ou antecipado e pelas mudanças de contexto, somos muitas vezes forçados a reajustar a nossa trajectória e a replanear alguns dos nossos objectivos futuros. Por outras palavras, à medida que vamos acumulando experiências, a nossa visão do mundo muda e podemos ter em conta outras variáveis nas nossas projecções e decisões e futuras, ajustando assim o nosso alvo final.
Por este motivo, a carreira é um processo em construção contínua e a sua gestão aproxima-se da imagem de um artesão a moldar o barro. Quando um artesão começa a trabalhar não sabe ao certo o resultado final. O produto que emerge pode tomar uma forma diferente dos seus anteriores trabalhos ou mesmo daquilo que ele se propôs fazer à medida que as suas mãos vão moldando o barro. Para este artesão, a acção precede o pensamento e um novo objecto pode aparecer a qualquer altura do seu processo de trabalho.
A imagem do artesão a moldar o barro é uma metáfora inspiradora, com implicações profundas para a nossa actuação. Nesta metáfora, cada um de nós é um artesão e a carreira o barro por moldar. À semelhança do artesão também nós podemos dar formas diferentes à nossa carreira à medida que acumulamos novas experiências de vida e novas competências. Pensar a carreira nestes termos torna-nos mais flexíveis e aumenta a nossa empregabilidade: permite-nos, sem sentimento de frustração ou insucesso, abrir mão do que havíamos intencionado por inadequação ao mercado actual e à pessoa que somos hoje.
Num mundo em permanente mutação, controlar o futuro é impraticável e, quase sempre, pouco adaptativo. Mais ainda, pensar que controlamos o futuro torna-nos alienados do presente. Por isso, gerir a carreira não é sinónimo de controlo mas de construção contínua. Para o nosso próprio desenvolvimento temos de ter a capacidade de perceber que o futuro pode ser reajustado à medida que se percorre o caminho até chegar a ele. Gerir a nossa carreira é ter a coragem de abrir mão daquilo que damos por adquirido e construir um novo significado à medida que nos modificamos com as nossas experiências pessoais. Gerir a carreira é ser o artesão da nossa própria vida. 

Andreia Rosa

domingo, 6 de abril de 2014

Jogar com o que Temos


Bandura falou a certa altura dos ganhos a longo prazo. É algo que faz parte da percepção de auto-eficácia. Se eu perceber que determinada forma de me garante mais ganhos, é essa a forma que terei de adoptar para a minha melhor adaptação. Neste sentido, poderei ter de abdicar de alguns ganhos agora, para que os de futuro, sejam maiores.
E é neste jogo que nos deparamos todos os dias. Como que num jogo de controlo, balançando o que queremos fazer com o que queremos obter. Jogando com as cartas que temos que nem sempre são suficientes para perceber a escolha a realizar e o caminho a tomar. Então fazemos o quê?
Bandura diria que faríamos aquilo para o qual somos melhor, associando a nossa percepção de auto-eficácia às nossas competências e comportamentos directos, desejando que o caminho escolhido fosse, assim, o que nos traria mais ganhos.
Mas como ter a certeza? Não se tem. Nem sei, contudo, se é suposto que se tenha.
Como não nos tornarmos reféns do que queremos agora? Fácil. Percebendo o que queremos no futuro e equilibrando a nossa necessidade de controlo com o que podemos ganhar.
Nem sempre é certo, mas é o caminho mais adaptativo.

Tiago A. G. Fonseca

sexta-feira, 28 de março de 2014

[Auto-cuidado]: Estar triste ou contente.


Estar triste ou contente, uma questão de foco?

Num período em que cada vez mais as pessoas se focam nas coisas más, nas notícias desanimadoras que recebemos na rua ou nos jornais, no que ainda falta fazer, em todos os sonhos que queriam alcançar e no facto de não o conseguir, proponho uma reflexão.

O que é diferente em nós quando estamos tristes ou contentes? Peço-lhe que pense um pouco nas diferenças que encontra nas situações que se lembra da sua vida. Penso ser um pouco comum que quando estamos tristes achamos que não somos capazes de fazer algo diferente, não temos esperança em que as coisas melhorem, não temos vontade de falar com as pessoas, nem sabemos como o fazer, não pensamos de uma forma desafiadora em sonhos. Quando estamos contentes tudo parece mais fácil, as pessoas falam connosco sem que tenhamos de fazer algo para que isso aconteça, as conversas acontecem de forma espontânea, parece que vemos sorrisos à nossa volta e temos vontade de transformar as caras tristes.
Porque não pensar em transformar a também a nossa cara triste? Não lhe peço para fingir que está tudo bem, para entrar num mundo imaginário em que só acontecem coisas boas. Peço-lhe sim para dar atenção também às coisas boas que lhe acontecem, para as equilibrar com as coisas menos boas, para ter um papel activo no seu próprio bem-estar. É como se tivéssemos uma balança dentro de nós, onde precisamos de colocar peso num dos pratos para se equilibrar e sentirmo-nos melhor. Se respeitarmos o que estamos a sentir e nos acarinharmos quando estamos tristes, podemos ganhar maior noção do que precisamos e movimentar recursos para satisfazer aquilo que precisamos nesse momento. O que precisa neste momento? O que acalmaria aquilo que está a sentir? O que pode fazer por si? Que prenda pode dar a si próprio/a?
Caminhos diferentes podem levar a destinos diferentes, só não levam se não tentarmos. E se não tentarmos, chegaremos ao mesmo destino a que temos sempre chegado, um destino que estamos cansados de conhecer, e que não nos traz novidade. Incluir novidade na sua vida pode ser uma forma de sair da rotina monótona e triste em que tem estado, pode ser o combustível que precisa para mudar um dia de cada vez, para sair de casa com mais força, para responder melhor quando alguém fala consigo.
Desafie-se a si próprio e às velhas formas de pensar. Será mesmo que nunca teve conquistas? Será mesmo que ninguém gosta de si? Tem assim tanta certeza de que as coisas não poderão ser diferentes? Quais serão as consequências de pensar de uma forma derrotista? Vamos fazer diferente amanhã?

Ana Sousa